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Publicado em 16 junho, 2023

OS PRINCIPAIS MITOS DA PANIFICAÇÃO

Mais um dia do panificador chegando e com ele oportunidade para nos reinventar. Dá medo? Com certeza! A padaria em que cresci com minha família administrando não tinha as mesmas características dos negócios atuais, mas a lei da sobrevivência exige, de todos nós, adaptação. Na minha rotina de consultoria percebo que duas situações são muito comuns. A primeira é quando o empreendedor começa o seu negócio e vai fazendo algumas coisas na intuição, muitas vezes por falta de um conhecimento mais especializado sobre determinados assuntos. A segunda é quando o empreendedor não se atualiza sobre inovações ou mudanças, e acaba fazendo daquele jeito porque “sempre foi assim”. E, geralmente, essas são as causas mais comuns para que mitos se espalhem e mentiras sejam tratadas como verdades, entrando em um ciclo vicioso que não agrega em nada nos negócios. Por isso, decidi trazer alguns dados e fatos concretos que desmistificam alguns assuntos em torno da panificação e servem para que você,empresário, consiga implementar rotinas e processos mais produtivos. Vamos juntos?

Vamos começar com a afirmação de que “para se ter sucesso é preciso abrir e fechar a loja todos os dias”. Considero isso um grande mito e arrisco dizer que o empresário tem mais chances de terminar a semana exausto e estressado do que ver resultados concretos nesse modelo de trabalho. Às vezes é preciso lembrar que o ditado popular “o olho do dono é que engorda o gado” não passa disso: um ditado popular. É preciso sim que o dono do negócio esteja por dentro de tudo o que acontece em sua loja e consiga corrigir o que não está dando certo, caso seja necessário. Mas, existem formas mais inteligentes de fazer isso. Investir em processos confiáveis, fazer medições reais da loja, capacitar lideranças e delegar funções já são bons caminhos a se pensar. Dedicar energia a abrir e fechar a loja todos os dias, sem outra estratégia por trás, só serve para drenar a energia do empresário e tirar o seu foco de uma boa gestão. Enquanto você abre e fecha a loja todos os dias, mina sua competência em liderar com maestria. 

Aproveitando que estamos falando em rotinas exaustivas e pouco estratégicas, trago aqui outro mito que escuto muito dos meus clientes. A frase “o meu cliente só compra produto do dia, portanto produzo tudo todos os dias” me causa arrepios, pois eu já imagino a produção se desdobrando para atender a essa suposta “exigência da clientela”, sendo que existem formas muito mais eficazes de trabalhar. Hoje, com a tecnologia que temos, é possível garantir o abastecimento de produtos frescos sem precisar, necessariamente, produzir no dia. E se você, panificador, não se adaptar, outros mercados farão. Um bom exemplo disso é a Oxxo, uma rede de lojas de conveniência e proximidade muito popular em São Paulo, que funciona 24 horas por dia e tem produtos frescos o tempo todo. O balcão de salgados chega a dar gosto, como dizemos aqui em casa. O pão francês é bonito que só! Isso quer dizer que tem produto sendo feito o tempo todo? Obviamente a resposta é não. Tecnologias, como o ultracongelamento, estão aí justamente para te dar um ganho de produtividade sem precisar repetir processos e mobilizar a equipe para produzir todos os dias. 

Dito isso, já vamos tirar o elefante da sala e deixar claro que “o congelamento de produtos faz com que os itens percam a qualidade” também não passa de um mito. Além da vantagem de antecipar a produção e ir finalizando os produtos conforme a demanda, o método também propicia o aumento da produtividade dos funcionários, concentração da produção, redução do índice de perdas e de rupturas, aumento do mix de produtos, produtos quentes mais vezes por dia, aumento de venda e melhora na qualidade de vida dos funcionários da produção. 

Além disso, gosto de destacar que o congelamento é possível de ser aplicado em diversos itens da área de padaria (sempre fazendo, quando necessário, ajustes nas receitas e nos processos para garantir que o resultado final do produto seja exatamente como o de um item preparado na hora). É possível congelar bolos já assados ou a massa crua, produtos folhados (como croissant e massas para sobremesas) e linha de queijos (como pão de queijo e biscoito de parmesão). Sem falar nos salgados, que depois você só precisa fritar ou assar no momento da venda! 

Para fechar essa conversa sobre produção, é comum ouvir por aí que “usar pré-mistura na fabricação dos produtos não tem a mesma qualidade de receitas próprias”. Na verdade, escolhendo boas marcas, é possível reduzir o tempo de preparo dos produtos, o número de ingredientes a serem pesados e as etapas da produção. A produtividade cresce em quantidade e diversidade de receitas ao mesmo tempo que traz padronização. Além disso, a pré-mistura é muito versátil e pode ser usada de diferentes formas, com diferentes ingredientes e se adaptar a diferentes situações: as pré-misturas não fazem com que a individualidade de cada padaria seja perdida. Elas são um método complementar, que utiliza de ingredientes naturais e artesanais em colaboração com a criatividade de cada padeiro. 

Outro grande mito entre os empresários é o de que “delivery tira o cliente da loja”. Essa frase, na verdade, traduz o medo que o empreendedor tem de que o cliente deixe de comprar no modelo físico. Mas, qual o problema disso se o cliente continua comprando de você de uma outra forma? O delivery é só um outro modelo de venda e que, convenhamos, não é de agora. Quem nunca ligou para uma pizzaria em um sábado à noite antes da popularização da internet e dos aplicativos de delivery? Também enxergo que esse medo do delivery, muitas vezes, mascara uma insegurança em relação a esse serviço. Contratar um entregador ou entrar nos aplicativos de entrega? Como fazer a gestão desses pedidos sem atrapalhar o serviço na loja? São questões válidas e que, de fato, precisam ser pensadas antes de implementar o serviço. Afinal, já que o cliente não terá contato direto com a empresa no espaço físico, é preciso que ele tenha uma boa experiência em outros âmbitos. Mas não use desse mito para justificar uma incompetência em gerir para ter resultados. 

Uma embalagem adequada e que preserve a qualidade do produto é essencial, assim como um serviço de entrega eficiente e que não gere transtornos ao cliente. Sei que dá trabalho pensar em tudo isso e ajustes precisarão ser feitos ao longo do caminho, mas isso não é desculpa para não oferecer o serviço de entregas na loja. Afinal, a concorrência já está oferecendo e sai muito mais caro ficar de fora desse movimento de mercado. 

Falando nisso, outro grande mito que escuto por aí é o de que “vendas online são uma modinha e perderam forma após a pandemia”. Bom, é justamente o contrário. Eu enxergo que o período de Covid-19 serviu justamente para acelerar um movimento que já estava ganhando força e mostrar para o consumidor como é conveniente comprar à distância. Concordo que, por um lado, o consumidor está com uma “ressaca” do pós-pandemia e anseia por experiências fora de casa. Porém, em contrapartida, o hábito de comprar online mostrou que o cliente pode poupar tempo e energia na hora de consumir, tendo suas necessidades atendidas sem sair de casa. Segundo recente pesquisa Webshopper, da NielsenIQ Ebit, em 2022, as vendas online no Brasil apresentaram sinais de estabilização, totalizando R$ 262,7 bilhões, 1,6% acima do ano anterior.

Alimentos e bebidas foram o principal destaque, com o maior crescimento em importância no volume de pedidos, passando a ocupar a 3ᵃ posição no ranking, atrás de perfumaria, cosméticos, casa e decoração. Se as vendas online fossem apenas uma moda, gigantes do setor supermercadista como Pão de Açúcar, Carrefour e Extra não gastariam tempo oferecendo plataformas online de vendas de alimentos, bebidas e outros produtos de consumo.

Portanto, considero um erro gigantesco que pequenas e médias empresas ainda insistam em ignorar o poder do online para efetuar vendas. Se não quiser fazer grandes investimentos ou ainda estiver inseguro em relação ao assunto, comece aos poucos. Ter um cardápio em plataformas como Goomer e cadastrar produtos no WhatsApp já é uma boa forma de começar. Só não fique parado dando desculpas enquanto a concorrência já está a todo vapor.

Assim como também é um mito a afirmação de que “a experiência de ir na padaria é insubstituível”. Com a minha fala sobre vendas online e delivery, já ficou muito claro que o cliente opta pelo que é mais conveniente para si e isso inclui a compra do pãozinho. Em vez de confiar apenas nesse mito, gaste energia e tempo traçando estratégias que vão garantir mais vendas – seja na loja física ou no ambiente online. Por outro lado, também quero pontuar que a experiência de ir na loja não acabou no pós-pandemia. Longe disso: dados do Instituto de Desenvolvimento das Empresas de Alimentação mostram que 47,5 milhões de pessoas entram em uma padaria todos os dias – representando 22,1% dos brasileiros. 

Mas, fica um alerta: o cliente não quer ir na loja e encontrar produto faltando, atendente de cara amarrada e uma verdadeira corrida de obstáculos com as caixas espalhadas pela loja cheias de produtos que deveriam estar nas prateleiras. Então, se olharmos desse ponto de vista, acho válido pensarmos em estratégias voltadas para aqueles que gostam de fazer suas compras presencialmente – investindo em atendimento personalizado e experiências que o online não permite ofertar. No entanto, não confie apenas nisso para vender. Seja estratégico e pense em diversas frentes. 

Agora, vou trazer uma verdade para equilibrar a balança. Venho escutando por aí que “ninguém deixa de comer pão” e eu concordo: apesar da preocupação cada vez maior com a saúde e a popularização de dietas, como a low carb, a verdade é que o consumo de pão francês no país mostra que está longe de acabar. Segundo levantamento da Ideal, de 2022, mostra que houve crescimento de 14,81% no volume de venda pão francês (R$), sendo esse item responsável por 8,8% da participação das vendas de pão francês sobre o faturamento total. Contudo, o cliente não está indo apenas à padaria e está comprando também por conveniência. Por isso, passou a comprar de outros players, como supermercados e lojas de conveniência.

Isso quer dizer que o pão francês está com “a vida ganha”? Claro que não. Os pães embalados conquistaram, com o passar dos anos, uma posição muito forte de saudabilidade, variedade, qualidade e com a conveniência de uma vida útil maior (shelf life). Além disso, o pão francês pode ser substituído por produtos que também são do hábito de consumo do brasileiro, como os itens à base de milho ou mandioca. Portanto, a boa notícia é que o brasileiro ainda tem o pão francês como um produto importante em sua rotina. Porém, é necessário redobrar os esforços em termos de qualidade e ter competência para vender, uma vez que a concorrência com outros produtos é forte.

São muitos mitos, eu sei. Mas uma verdade é certa: você, panificador, merece uma salva de palmas por seu trabalho! Viva a panificação brasileira, que, como qualquer outro setor, tem suas dificuldades, mas reverbera boas energias de um povo acostumado a não fugir da luta, a ser caloroso e apaixonado pelo que faz. Você merece todos os  parabéns! Espero que esse conteúdo tenha ajudado a abrir seus olhos para algumas questões importantes e conte sempre conosco nessa incrível missão que é alimentar o Brasil. 

Sucesso e boas vendas!